Prezados investidores,
O ano de 2025 abriu com importantes desenvolvimentos ao redor das economias, com destaque para a esperada posse do novo governo americano, sob a administração de Donald Trump. Demais, contamos com novas rodadas de decisões de política monetária. Abaixo, trazemos nossa visão atualizada do panorama macro das principais economias ao final de janeiro.
Estados Unidos
Nos Estados Unidos, a evolução da atividade econômica, especialmente do emprego e inflação seguiram sob os olhares atentos dos investidores, especialmente após surpresa mais hawkish na postura do FED em sua reunião de dezembro. Demais, o mês contou com a inauguração do governo Trump, com grande expectativa em torno das medidas à disposição do presidente já no primeiro dia de mandato. Ao longo da campanha várias foram as sugestões do presidente no sentido de medidas agressivas e decisivas tão cedo quanto o primeiro dia, através do expediente das “executive orders”.
Nesse contexto, fomentou-se um receio de ações de grande peso, especialmente no tema das tarifas. Com efeito, nos dias que sucederam o evento de posse vimos nova pernada de alta nos juros de 10 anos, bem como no dólar index. Nesse movimento vemos uma confluência de fatores que, como nos meses anteriores, reflete também uma visão mais bullish para a economia americana, amparada nos dados. De fato, nas duas semanas que antecederam o evento contamos com a divulgação dos dados para o mercado de trabalho e inflação referentes a dezembro. Neles, destacamos forte geração de vagas anotadas pelos dados do payroll (256 mil ante 165 mil esperados), como surpresa baixista na taxa de desemprego, que voltou a recuar (4,1%, de 4,2% em novembro). Os números mais fortes contribuíram para dar tração às expectativas de uma política monetária mais austera, contemplando menos de 2 cortes de juros ao longo deste ano. Pouco depois foi a vez dos números de inflação. Neste front, houve algum alívio marginal, vindo de números desconfortavelmente mais altos até outubro. O núcleo da inflação voltou a rodar perto dos 0,2% ao mês, de uma média de cerca de 0,3% nos três meses anteriores. Em destaque, o processo de desinflação em habitação deu sinais adicionais de progresso, registrando dois meses com taxas de variação próximas das mais baixas neste ciclo. Prosseguindo, este movimento tem importante contribuição a oferecer para a desinflação da economia americana.
Em suma, por detrás do movimento de alta de juros e do dólar americano na antessala da posse, bem como nos dois meses anteriores, há um decisivo papel desempenhado pelo chamado excepcionalismo americano, que conjuga um crescimento surpreendentemente robusto e inflação mais persistente, comandado por uma política monetária mais apertada pelo banco central americano.
Há, também, um componente que se relaciona com prêmio de risco em torno das expectativas para o que virá a ser o mix de política econômica do Governo Trump. No entanto, percebemos que há alguma leniência quanto aos riscos de as tarifas serem algo mais do que simples ferramentas de negociação. Com efeito, logo após a posse, a ausência de medidas mais incisivas pareceu chancelar a visão mais benigna sobre o tema, que ofereceu espaço para alguma descompressão no dólar. Com efeito, o dólar saiu de 109,3 a 107,3 na semana da inauguração. Pouco depois, falas do presidente no sentido de tarifas para economias como México, EU e Canada deram novo fôlego para a moeda, culminando com o anúncio de 25% em tarifas sobre México e Canada sob o pretexto de combate ao problema do fentanyl.
A imposição efetiva das tarifas, com abrangência notadamente maior do que o realizado no primeiro mandato, voltou a trazer as preocupações sobre os rumos da política comercial, dando força ao dólar. Ainda assim, boa parte das análises descreve as medidas como “big sticks” voltadas aos parceiros comerciais na busca por um acordo benéfico aos EUA. Neste primeiro caso, concordamos. Mas há pouca importância dada a outras atribuições das tarifas dentro do framework do novo presidente. Pouco se discute a importância deste instrumento, na visão do Governo, como ferramenta de política industrial, fomentando um desejo de reindustrialização; além de seu uso como alavanca de arrecadação, em um push efetivo no sentido de redução do déficit público americano, que vemos como genuíno. Desta forma, entendemos que há amplo espaço para novas surpresas vindo de Washington, com potencial ainda relevante de amparar movimentos de força do dólar.
Para fechar, janeiro trouxe também a esperada pausa no ciclo de cortes de juros, telegrafada por Powell na reunião que encerrou 2024. O comunicado da decisão veio com poucas alterações, que foram minimizadas por Powell ao longo da conferência de imprensa. Em linhas gerais, foram poucas as alterações na comunicação e no plano de voo em relação a dezembro. A retomada do ciclo de cortes vai depender, ultimamente, de maior progresso no processo de desinflação ou de inesperada piora no quadro do mercado de trabalho. A robustez da atividade, em especial do mercado de trabalho, sob um quadro que traz alguma acomodação no movimento de desinflação, autoriza a cautela do BC americano, especialmente tendo cortado já 100 bps de juros no último trimestre do ano passado. Demais, continuamos vendo um FED receoso dos riscos altistas para a inflação, especialmente o padrão de residualidade sazonal que temos visto no primeiro trimestre dos últimos anos. Dessa forma, vemos novo corte já em março como improvável, mas entendemos como altas as chances de novo movimento tão cedo quanto maio. Há algumas incertezas que se relacionam com o espectro de guerra comercial, mas que se perseguida de forma plena acarretaria queda da atividade econômica americana. Se não afetar decisivamente as expectativas e se de fato ameaçar o crescimento, vemos o FED olhando através do choque como um movimento one-off. Portanto, continuamos enxergando espaço para 3-4 cortes ainda neste ano de 2025.
Europa
Do outro lado do atlântico o cenário europeu, que segue bastante desafiador, contou com notícias menos negativas na ponta. O cenário para o crescimento não inspira grande otimismo, como descrito pela surpresa baixista com o PIB do 4º trimestre de 2024 (estável, vs 0,4% no 3T24 e 0,1% de alta esperada). Mas as leituras para os PMI’s de janeiro trouxeram, em linhas gerais, números marginalmente menos negativos. Quer dizer, a economia ainda retrai na ponta, mas este ritmo foi cadente entre dezembro e janeiro.
Continuamos com visão pouco otimista para a economia do bloco. De um lado, o mercado de trabalho ainda não dá indícios de piora material e o recente movimento de afrouxamento monetário pode estimular o crédito. A redução da inflação também contribuiria para aliviar a pressão sobre a renda real e criar condições para alguma retomada do consumo. De outro lado, entendemos que os problemas estruturais se sobrepõem a eventuais impulsos cíclicos. O crescimento potencial da economia europeia é baixo e as principais economias, na forma da França e Alemanha, encontram grandes dificuldades para o crescimento este ano. Este quadro é ainda mais desafiador sob o risco de um conflito comercial com os americanos. A mera incerteza tarifária já é suficiente para produzir rusgas no ritmo de expansão da economia europeia.
Do lado da inflação continuamos assistindo lento movimento de descompressão. Os números cheios e em 12 meses têm avançado nas últimas leituras, mas em linha com o esperado e refletindo os chamados efeito-base, por preços energéticos mais altos do que há um ano. O ponto crucial é a inflação de serviços, cuja desinflação tem sido mais lenta. Neste front continuamos assistindo progresso, especialmente nas médias móveis de 3 meses. Se a trajetória recente se firmar no começo de 2025 a batalha estará essencialmente ganha. Sob este pano de fundo o ECB decidiu novamente pela redução de 25 bps nas taxas de juros, movimento idêntico ao entregue já em janeiro. A comunicação tampouco trouxe mudanças importantes. O ECB continua descrevendo o balanço de riscos para a inflação como equilibrados, ao passo que para o crescimento os riscos permanecem baixistas. Neste ambiente há espaço para seguir avançando em cortes até a vizinhança do juro neutro, hoje percebido pela maioria como em 2%. Continuamos com a visão de que os juros europeus terão de rumar de forma mais firme em sentido estimativo até o final do ano.
China
Indo à Ásia o mês foi de menos desenvolvimentos na economia chinesa. As autoridades seguiram em compasso de espera, aguardando possíveis investidas dos americanos, principalmente no front comercial. O risco de tarifas mais abrangentes segue bastante relevante, com consequências não desprezíveis para a economia chinesa.
Do ponto de vista de atividade o destaque do mês ficou a cargo dos dados relativos ao crescimento do PIB, que ilustraram números mais fortes do que esperado. De fato, a economia chinesa cresceu 1,6% na passagem do trimestre, com os quais ela bateu a meta de crescimento anual, em precisamente 5%. Os dados mensais para o varejo e indústria referentes a dezembro também trouxeram números mais fortes, consolidando um esforço de crescimento ao final do ano passado.
Na ponta, contudo, vemos sinais de pouco dinamismo. Os PMI’s de janeiro, divulgados no final do mês revelaram perda de momentum na entrada de 2025, com destaque para o ingresso do PMI manufatureiro em terreno contracionista.
Mesmo sem investidas severas dos americanos no tema das tarifas, enxergamos uma economia chinesa em situação frágil e bastante dependente de novas rodas de impulso para garantir as metas de crescimento deste ano. Detalhes efetivos do arsenal preparado em Beijing somente devem ser conhecidos lá para março, salvo por efeito de maior agressividade norte americana a curto prazo.
Japão
No Japão, após postura mais dovish do BOJ na reunião de dezembro, observamos uma correção de rota que se expressou em alta de 25 bps na taxa de juros básica do país asiático. Em dezembro os mercados atribuíam alta probabilidade à alta de juros, ancorados na evolução dos dados de inflação, particularmente nos consistentes sinais de repasse dos reajustes salariais aos preços. Em meados do mês o noticiário abriu espaço para uma postura mais branda, com relatos de hesitação entre alguns membros do board. A ausência de altas então, bem como uma comunicação mais dove, se traduziu em pressão sobre a moeda japonesa, que perdera 4,7% apenas em dezembro.
Sob este contexto, em janeiro, o BOJ decidiu por retomar o movimento de alta de juros, oferecendo um comunicado mais austero e projeções de inflação majoradas. Em destaque, a projeção para os 12 meses encerrados em março de 2026 subiu a 2,4%, de 1,9%, logo acima da meta. No mesmo sentido, o balanço de riscos para a inflação ao longo de 2025 foi descrito como altista. Um trecho que fez parte da postura dove em dezembro, refletindo preocupações com a economia global e incertezas relativas aos Estados Unidos foi removido. As falas das autoridades do banco seguiram expressando confiança na continuidade do processo de normalização, desde que amparados pelos dados.
Enxergamos no BOJ a disposição de avançar com novos movimentos de alta de juros, mas não sem o receio de surpreender ou chocar os mercados, receosos dos movimentos de mercado colhidos quando do início do ciclo de normalização, na metade do ano passado. A evolução das negociações salariais, que devem trazer nova rodada de reajustes importantes neste começo de 2025, deve oferecer maior conforto quanto à continuidade dos repasses salário-preço e autorizar novas altas no curso deste ano.
Brasil
No Brasil, janeiro foi marcado por reversão parcial da forte deterioração que assistimos entre novembro e dezembro, tracionada pelo desconforto com a situação fiscal após a frustração com o pacote de novembro e a proposta de reforma do imposto de renda, sem contar a pressão de dólar forte globalmente.
Contribuiu para este movimento a posição técnica do mercado, dado o tamanho da piora, quase sem trégua, nos meses anteriores. No mesmo sentido, o recesso em Brasília minimizou uma das fontes de constante pressão.
Neste ambiente, a moeda brasileira figurou com destaque em termos de apreciação ao longo do mês, ganhando cerca de 6,8% contra a divisa americana. O atrativo diferencial de juros, alguma descompressão de prêmios de risco e menor volatilidade jogaram a favor da moeda brasileira, que encerrou o mês de volta a casa dos 5,85, tendo batido mais de 6,2 no curso de dezembro. No mesmo movimento, a parte longa da curva de juros queimou bastante prêmio. O juro de 10 anos, por exemplo, fechou 40 bps no curso do mês.
Do ponto de vista fundamental, não enxergamos como sustentável o movimento observado no curso do mês. Alguns analistas apontam para recentes pesquisas de opinião, revelando relevante perda na popularidade do Governo Lula, como catalisadores para o movimento de melhora, num movimento que precifica as chances de alternância de poder a partir de 2026. Esse debate nos parece excessivamente precipitado. O governo ainda tem munição para garantir chances competitivas de reeleição e a figura do presidente continua carregando peso enquanto candidato. Demais, o governo vai redobrar os esforços de comunicação, como sugerido pela nomeação de Sidônio Palmeira para a Secom e pela coletiva de imprensa do presidente no curso do mês, em diálogo mais direto e ocupando os televisores e celulares da população. Isso sem contar com o indigesto tema da reforma da renda, que nos parece estratégia chave do governo para sedimentar o caminho à popularidade junto de uma parcela decisiva do eleitorado brasileiro. Há grande desafio em tornar a proposta efetivamente neutra do ponto de vista fiscal, com boa parte das compensações envolvendo, de uma forma ou outra, o aumento da taxação sobre a parcela mais rica da população. O congresso oferecerá, em nossa leitura, restrição a estas iniciativas, mas o ônus político de se colocar contra a isenção parece muito pesado para aspirantes a reeleição há cerca de um ano do novo pleito. Daí surge o risco de uma compensação fiscalmente imprudente, como vimos em 2024 com a desoneração da folha para 17 setores da economia.
Em outra frente, a evolução da economia também não parece inspirar grande otimismo. Ao longo do mês conhecemos os dados de atividade para novembro de 2024, que, em linhas gerais, começam a dar conta de uma desaceleração mais marcante na economia brasileira. Dados de crédito e emprego, já para dezembro, também dão conta de perda de tração. Em nossa leitura, esta será a direção de viagem, o que redobraria a pressão sobre iniciativas não convencionais do Governo como por meio de iniciativas parafiscais ou crédito direcionado.
Do lado da inflação o cenário também segue desafiador. O consenso entende que a situação seguirá pressionada ainda neste começo de ano e as expectativas para ano já chegaram em 5,5%. No curto prazo o qualitativo também é negativo, com destaque particular as pressões em serviços subjacentes. Neste contexto, entendemos que há pouco espaço para o BC encerrar o ciclo de alta de juros tão cedo quanto março. Na reunião deste mês, em que a autoridade aderiu ao guidance de 100 bps inaugurado em dezembro, houve algumas críticas ao comunicado. Agentes descreveram como dovish, por efeito em especial de dois vetores: i) a inclusão do risco à atividade como risco baixista para a trajetória de inflação; e ii) pouca ênfase, percebida, quanto à magnitude da desancoragem de expectativas. Nós temos leitura diferente. A comunicação toda tem enfatizado por inúmeras vezes a centralidade das expectativas desde o começo do ciclo, especialmente em dezembro quando da alta de 100 bps e do guidance de mais 200 bps adicionais entre janeiro e março. Demais, reconhecer o risco baixista para a economia em um quadro em que os juros avançam brutalmente para cima dos níveis neutros nos parece simplesmente “economics 101”. Isto poderia sim, se materializado, tornar-se um freio para o quão mais distante podem ir os juros, mas não nos parece essa a sugestão do BC já agora. Continuamos esperando uma Selic de 15,5% em junho deste ano, seguida de pausa até fins de 2025, a partir de onde podemos começar a enxergar alguma redução. Vale lembrar que os níveis de juro real estão em patamares extremamente restritivos. O impulso fiscal e dinamismo do crédito em 2024 mascararam a restritividade da política monetária, que esperamos se revelar de forma mais plena ao longo de 2025, especialmente sob um impulso fiscal potencialmente neutro.