A Estratégia da Iochpe Maxion na Indústria Automotiva
Escrito por: Pedro Nogueira

A Estratégia da Iochpe Maxion na Indústria Automotiva

A Iochpe Maxion, maior produtora de rodas do mundo, iniciou sua trajetória no segmento madeireiro, mas diversificou seus negócios, atuando também em atividades do setor financeiro e industrial. O modelo de ampla diversificação não gerou bons resultados e a empresa voltou seus esforços para aquilo que entende ser seu core business, onde tem enorme conhecimento: produção de rodas de aço e alumínio, para veículos leves e comerciais, e componentes estruturais.

Introdução

Um tema comum nos escritos e falas de grandes investidores é a necessidade de se escolher as melhores empresas para que se tenha excelentes retornos ao longo do tempo. Claro, esse não é o único ponto, mas é muito importante. Excelentes empresas apresentam, dentre muitas características, retornos sobre o capital empregado acima dos concorrentes, margens elevadas e crescimento de lucro e receita.

Apesar dessa intersecção, não fica claro exatamente o que de fato é ou o que torna uma empresa um excelente negócio. Qual é o ou os fatores que geram rentabilidades elevadas? Existe, então, um vão entre o que lemos e o que, na prática, se traduz em retornos acima da média. Para preencher essa lacuna, é preciso entender não só o dia a dia da empresa, mas como as pessoas que estão lá tomam suas decisões, quais os processos e o que a torna diferente de seus competidores, de forma a gerar uma performance superior.

Evidentemente esse é um tema complexo demais para ser tratado em uma carta, mas pode-se ter noção do que isso significa.

De forma resumida, barreiras de entrada são fatores que dificultam (ou tornam altamente custosa) a entrada de um novo competidor em uma determinada indústria. A sua importância deriva do fato de que a concorrência age para reduzir o lucro sobre o capital investido do setor, então fatores que dificultam a entrada de um novo concorrente no ambiente competitivo agem de forma a tornar os incumbentes mais rentáveis do que seriam em um ambiente de maior competitividade.

Barreiras de entrada podem surgir da diferenciação que determinado concorrente tem em seu produto, de economias de escala que geram o declínio do custo unitário à medida que o volume absoluto por período aumenta, da elevada quantidade de capital exigido para fazer os investimentos necessários, por vantagens de custos derivados da experiência, dentre outros.

Uma indústria que talvez, para olhos menos experientes, pode parecer simples, mas que tem elevado grau de complexidade e apresenta grandes barreiras de entrada é a indústria automotiva. Mais especificamente, a indústria de rodas.


A época de grande diversificação parece ter deixado traumas, e o management faz questão de se manter dentro do seu círculo de competência. Essa, por si só, é uma enorme qualidade. É muito comum entre aqueles que atingem enorme sucesso em determinada área o (muitas vezes falso) entendimento de que são capazes de serem tão brilhantes quanto em outras atividades.

São raros os exímios gestores e alocadores de capital capazes de performarem com excelência em setores distintos e esse é o tipo de comportamento que pode levar à ruína excelentes empresas. A final de contas, por mais que você ame sorvete de creme, se uma porção de moscas se misturarem ao sorvete, sua sobremesa estará arruinada. O mesmo vale para empresas. Se bons negócios são contaminados por maus negócios devido a uma má alocação de capital, o todo estará fadado ao fracasso.

Charlie Munger disse uma vez que “people who specialize in the business world—and get very good because they specialize—frequently find good economics that they wouldn’t get any other way”. Ao nos voltarmos para a microeconomia, chegamos à ideia de economias de escala, conceito de vital importância para determinar o sucesso ou fracasso de uma empresa. A curva de experiência é uma importante economia de escala, dado que ao fazer algo complexo em volumes cada vez maiores, em determinado momento, entende-se como fazê-lo de forma mais eficiente. Naturalmente, quanto mais você se acostuma com algo, mais fácil o processo se torna.

A natureza do negócio de produção de rodas é uma de baixas margens, não se tem poder de preço, uma vez que muitos dos contratos são definidos com as montadoras com base nos custos incorridos na produção das rodas. Com isso, a eficiência no processo produtivo se torna extremamente importante para manter ou melhorar suas margens de lucro.

Ao se especializar na produção de rodas (que será nosso foco, dado que a divisão representa a maior parte das receitas da empresa), a Iochpe Maxion foi capaz de desenvolver processos e tecnologias que a tornam cada vez mais eficientes e, mesmo que um funcionário da empresa vá para um concorrente, dificilmente serão capazes de copiar o modelo da empresa.

Olhemos então para o processo de produção das rodas. Quanto mais fluido ele for, mais volumes serão produzidos e maior será a diluição de custos fixos, acarretando melhores margens. Importante dizer que, independentemente do grau de automação de cada fábrica, diferentes ferramentas são necessárias para a produção de diferentes modelos de rodas. Identificamos, então, um processo importante, que deve ser feito de forma eficiente.

A especialização fez com que a empresa fosse capaz de desenvolver um método ágil de troca de tais ferramentas, reduzindo a perda de tempo entre a produção de um modelo e de outro. Quanto maior for o grau de automação de uma fábrica, maior o tempo necessário para realizar a troca das ferramentas, de forma que fábricas mais automatizadas tendem a produzir menores variedades de rodas e as menos automatizadas produzem mais variedades. Apesar da diferença de eficiência entre cada uma de suas fábricas, na média, a empresa se tornou extremamente eficiente nisso e realiza as trocas em tempo muito competitivo dentro de sua indústria.

Tal conhecimento faz com que a empresa seja capaz de conquistar maiores ganhos de produtividade, gerando melhores retornos em relação aos competidores. Isso é muito importante, dada a relevância de se ter grandes volumes de produção para as empresas do setor. Isso, por si só, é uma barreira de entrada altamente relevante, que dificulta a vida de um potencial entrante que deseje se aventurar no mundo da fabricação de rodas para veículos leves e comerciais.

Além de tornar seus processos mais eficientes, a experiência, fruto da especialização, também tornou a empresa referência em inovação. Um exemplo disso é a Reduced Rim Technology, uma tecnologia proprietária, desenvolvida pela empresa, que otimiza o processo de produção, reduzindo a quantidade de material usado na roda e, por consequência, seu peso, sem comprometer sua robustez ou funcionalidade.

A empresa aplica tal solução na produção de certos modelos de rodas de alumínio, sendo capaz de reduzir seus custos de produção, ao mesmo tempo que reduz sua emissão de gás carbônico e melhora a eficiência do carro. O alumínio, diferente do aço, pode ser reutilizado no processo produtivo, de forma que todo o material descartado volta a ser usado na fabricação de novas rodas, diminuindo a necessidade de se adquirir mais matéria prima. Por usar diferentes tipos de aço em diferentes tipos de roda, o “cavaco” de aço que é descartado é vendido como sucata.

Essa, dentre outras tecnologias, fez com que a empresa se tornasse o supplier of choice das montadoras globais, sendo a qualidade de seus produtos e processos amplamente reconhecidos na indústria. Está enraizado na cabeça das montadoras que a Iochpe Maxion é uma excelente parceira no desenvolvimento de novos produtos, que se dão em conjunto no momento de sua idealização.

Outro quesito importante diz respeito à economia de escala vinda dos volumes produzidos e da diversificação geográfica. A Iochpe Maxion produz em torno de 50 milhões de rodas todos os anos, em 32 unidades fabris e em 14 países diferentes. Para que um novo concorrente decida entrar na indústria de forma competitiva, ele terá que realizar enormes investimentos em capacidade fabril e ser capaz de produzir e vender elevados volumes de forma a viabilizar sua operação. Essa será uma tarefa difícil e que trará enormes prejuízos antes de que os frutos iniciais sejam colhidos, dificultando tal movimento.

A diversificação geográfica também é uma enorme vantagem competitiva da empresa, gerando a suavização de seus resultados. Isso fica muito evidente no ano de 2023. O Brasil é o principal mercado da Iochpe Maxion e, por conta da transição tecnológica para o padrão Euro 6 dos caminhões (que os tornam mais caros) e das restrições de crédito e renda disponível para compra de carros, os resultados dessa divisão estão sendo extremamente afetados negativamente ao longo do ano. Por outro lado, a excelente performance no continente europeu e bons resultados na América do Norte (onde a demanda está além de sua capacidade produtiva), fizeram com que a empresa fosse capaz de mostrar melhora operacional no segundo trimestre.

Além disso, a diversificação geográfica se mostra um desafio por si só, uma vez que é preciso que diferentes requisitos de qualidade e segurança sejam atendidos para que seus produtos sejam comercializados. A capacidade de se adaptar a diferentes mercados e ser extremamente competitiva é mais um ponto importante para a empresa.

Fica evidente que a indústria demanda elevada quantidade de capital, seja para o desenvolvimento de novos produtos, para o aumento de capacidade ou para se manter competitivo. Com isso, a eficiência na alocação de capital é chave para determinar o sucesso.

A disciplina é uma característica no management, que busca sempre alocar seu capital da forma mais eficiente possível, exigindo uma elevada taxa interna de retorno e em mercados que lhe proporcionem boas taxas de crescimento e rentabilidade. Um exemplo disso é a fábrica de rodas de alumínio recém-inaugurada na Índia, que conta com margens superiores ao consolidado da empresa e com um promissor mercado consumidor.

Anthony Bolton, antigo gestor do Fidelity Special Situations Fund, disse uma vez: “My collegue Peter Lynch said that you should be able to summarise in a few sentences why you own a particular company’s shares in a way that even your teenage son or daughter would understand. This is your investment thesis and I would go on to say that you should retest this thesis at regular intervals”.

A Iochpe Maxion, além de ser líder global de sua indústria, tem know how no campo da inovação de processos e produtos, que geram vantagens competitivas difíceis de serem replicadas. O time de gestão altamente qualificado e sua posição competitiva a colocam em destaque e a empresa negocia a uma fração de seu valor intrínseco e de seu valor de reposição. Isso era verdade quando entramos na empresa e isso segue sendo verdade hoje. A diferença é que a empresa agregou ainda mais valor ao seu acionista, adicionando mais avenidas de crescimento rentáveis e, por consequência, se mostrando ainda mais barata do que estava quando a compramos.

De maneira semelhante, podemos dizer que a empresa, além de ser simples de entender e difícil de replicar, é tocada por excelentes pessoas, com sentimento de dono e com enorme conhecimento em sua área de atuação. Seu core business é vender um produto que seguirá sendo demandado enquanto os carros dependerem de rodas, independentemente de serem movidos a combustão ou eletricidade. O melhor, porém, é podermos adquirir tal empresa por um bom preço.

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